Chegou o Inverno


Chegou o Inverno. É a melhor notícia desde que acabou o Inverno. Agora já não há razão para não haver vento gelado a cortar a respiração de quem sai à rua sem um longo casaco até à boca; acabaram-se os sumos de laranja açucarados a substituir chás à lareira, e as t-shirts coladas ao peito. Agora há cachecóis às riscas azuis e brancas a esvoaçar sobre as pedras da calçada, e praias desertas com areia fria. As ruas ficam mais limpas e o ar mais transparente. O Inverno, mesmo em Lisboa, é mais branco do que o verão. Há dias em que cai chuva e podemos ficar em casa sem peso na consciência. O Inverno traz Borges e filmes em série, e meias aquecidas. Há mantas e avós a tricotá-las. Os senhores das lojas da Baixa usam coletes de lã verde e têm o cabelo branco despenteado sobre a careca, porque se esqueceram de se olhar ao espelho quando entraram na loja de manhã. Saem vapores quentes das lojas e dos cafés. Os olhos ficam mais profundos e a barba pica mais. No Inverno, as roupas são mais escuras e as mulheres usam botas castanhas. Custa sair do duche de manhã. Os pés acordam frios. Até é frio, o Inverno em Lisboa. Mas tem sol, luzes de fim de tarde, ondas que batem com força e fazem espuma; vendedores de castanhas, miradouros aquecidos para agarrar no café com luvas escuras. Tem lisboetas de cabelo ondulado e batôn para o cieiro. Sorriem sempre quando abordadas, as lisboetas, mesmo no Inverno. Eu também. Adoro o Inverno. Ainda bem que chegou.

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